DR DANIEL EM DEBATE NA ENSP
Na abertura do Centro de Estudo, o diretor da ENSP, Hermano Castro, destacou a importância de debater a gestão da saúde na cidade do Rio de Janeiro, principalmente no momento em que os questionamentos vêm das ruas e da sociedade, na busca por uma perspectiva de saúde de qualidade. Maria Angélica Borges dos Santos, pesquisadora da ENSP responsável pela coordenação do debate, afirmou que cobertura universal e financiamento da saúde são temas de ponta e estão em constante discussão. “Ambos são muito caros à saúde e, para isso, reunimos neste evento diferentes níveis de gestão – executivo, representado pelo secretário Daniel Soranz, e legislativo, por meio do vereador Paulo Pinheiro – e acadêmicos para fomentar a discussão.”
Daniel Soranz, subsecretário de Atenção Primária, Vigilância e Promoção da Saúde do Rio de Janeiro, abriu o debate e apresentou a avaliação dos três anos de experiência dos novos modelos de gestão na atenção básica no Rio de Janeiro. Além de discriminar o que foi e vem sendo realizado no Rio de Janeiro, ele ressaltou que a opção por determinado modelo de atenção não está isenta de finalidades e valores, explícitos ou implícitos. Segundo Soranz, houve, na gestão anterior, um crescimento significativo dos planos privados de saúde (52,8%) que possuíam 2.459.561 beneficiários, em 2000, e passaram a contabilizar 3.371.459, em 2009.
“O cenário no Rio de Janeiro era complicado. Éramos uma das cidades com maior gasto per capita em saúde do país, com os piores indicadores até 2008, e possuíamos o menor financiamento público municipal entres as capitais. Além disso, 83% do nosso orçamento em saúde era em gastos com hospitais”, explicou. A partir de 2009, foi iniciada a Reforma nos Cuidados em Atenção Primária (RCSP) na cidade do Rio de Janeiro pela Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil, que colocou a atenção primária como ordenadora das redes de atenção. Essa reforma foi dividida em três componentes: organizacional, administrativo e modelo de atenção. Daniel focou sua apresentação na reforma administrativa.
De acordo com o subsecretário, a reforma administrativa possuía muitos desafios: a execução orçamentária, o tempo médio dos processos, o tempo de remanejo, a transparência dos contratos, o fortalecimento do Sistema Único de Saúde, entre outros. Com base nessas necessidades, elaborou-se o arcabouço jurídico para a criação das organizações sociais de saúde (OSS), que deram origem aos contratos de gestão como convênio. Desde então, explicou Daniel, a atenção primária está no assento condutor da saúde na cidade do Rio de Janeiro. Ele citou ainda muitos processos que tiveram grandes e importantes mudanças após a adesão do modelo de gestão baseado nas OSS. Por fim, o subsecretário apresentou números que apontam melhorias de saúde e qualidade de vida da população e ressaltou que, em 2016, a tendência é que os cariocas tenham a maior expectativa de vida do país.
“Para definição e monitoramento das metas, rever o modelo de gestão administrativa foi condição sine qua non. A cidade buscou, a exemplo de outros municípios brasileiros, o modelo das OSS como alternativa para flexibilidade e agilidade gerencial, autonomia financeira e administrativa, voltadas para os resultados e para a sua clientela, com o intuito de racionalizar a utilização dos recursos e incrementar a prática de prestação de contas, associando responsabilidade na alocação de recursos a desempenho e resultados sociais. Isso sem dispensar os mecanismos do aparato estatal de controle e auditoria, como órgãos de Controladoria-Geral e Tribunal de Contas do Município”, finalizou.
Na contramão das Organizações Sociais de Saúde
Apresentando uma visão oposta à do subsecretário Daniel Soranz, o vereador Paulo Pinheiro abordou a situação da saúde no Rio de Janeiro, que, segundo ele, não anda bem. O vereador questionou a retirada da gestão da administração da saúde e a adesão a uma nova gestão baseada nas OSS. Ele citou, ainda, alguns projetos de sua autoria que foram apresentados com vistas à melhoria da qualidade da atenção básica. Em seguida, falou sobre a Lei n° 5.026 de 19 de maio de 2009, conhecida como a Lei das OSS, que dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais e dá outras providências, e salientou as formas de execução e fiscalização dos contratos de gestão.
Segundo o vereador, muitos contratos de gestão estão sendo fiscalizados atualmente e podem ser encerrados em virtude do alto número de irregularidades. Aproveitando o gancho dos dados apresentados pelo subsecretário de saúde, Paulo Pinheiro questionou os números e apontou a demora na marcação de médicos e exames, a alta rotatividade de profissionais médicos, entre outros aspectos latentes na insatisfação da população com a saúde no Rio de Janeiro. Diante dos problemas citados, Paulo questionou: por que não a administração direta?
Por fim, o vereador apresentou a proposta orçamentária da Prefeitura para 2013 e apontou o aumento da receita das despesas decorrentes do modelo de gestão adotado atualmente na cidade. Encerrando sua apresentação, Paulo Pinheiro citou as análises do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro (TCM) sobre o desempenho das organizações sociais que atuam sem concurso e sem licitação e questionou, mais uma vez, a criação da Empresa Pública de Saúde do Rio de Janeiro, a RioSaúde. “Essa empresa passa a ter responsabilidade sobre a gestão de todas as unidades básicas de saúde do Rio de Janeiro. O que nos resta saber é exatamente como pretende atuar a RioSaúde”, destacou.
O debate retornou para a academia com o pesquisador Nilson do Rosário, do Departamento de Ciências Sociais da ENSP. Ele iniciou sua apresentação citando uma oficina, realizada no Rio de Janeiro, sobre o papel das OSS. Categórico, afirmou que a falta de coerência entre o que defende e o que implementa é, hoje, a maior crítica ao sistema de saúde brasileiro. O professor apontou ainda a dificuldade em avaliar os contratos fechados com base no formato de gestão das OSS e citou que São Paulo também passou por uma reforma e, atualmente, possui uma atenção básica favorável. “Necessitamos de mais clareza nas questões políticas. O Rio de Janeiro é uma cidade dividida que tenta ser global, o nosso desafio é incluí-lo nessa globalidade”, disse.
Fechando o debate, a pesquisadora Maria de Fátima Siliansky, do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ, fez suas considerações com base em duas grandes pesquisas de que participa. Ela pontuou as lógicas dos modelos de gestão baseada na administração direta de pessoas e recursos e na terceirização da gestão. Segundo ela, ao contrário do que vem sendo propagado, o modelo de terceirização de contratos não é recente e é adotado em outros países. A professora também descreveu problemas na avaliação no setor serviços, “quantidade de serviços pode não significar efetividade do sistema de saúde”.